Review | Devil’s Drizzle
Não é todo dia que um jogo brasileiro consegue capturar tão bem a essência dos clássicos de plataforma dos anos 90 e, ao mesmo tempo, entregar uma experiência original, emocional e criativamente instigante. Devil‘s Drizzle, ou Chuva do Capeta, faz exatamente isso. Desenvolvido por Filipe Acosta sob o selo Cozy Creeps Games e distribuído pela ZNT Productions, o jogo é uma aventura em 2D que mistura carisma, melancolia e um bocado de trovão.
A jornada começa com uma perda: uma criança dá início à busca por seu melhor amigo, um guarda-chuva de gatinho falante. Parece simples, quase trivial, mas é aí que o jogo revela sua profundidade. O guarda-chuva não é apenas um objeto perdido; ele simboliza companhia, proteção e talvez a única âncora emocional de um mundo que ameaça desabar a cada gota de chuva.
Tudo isso se desenrola em um universo sombrio e encantador, onde a escuridão domina o cenário e só se revela através da luz de pequenos raios coletados pelo jogador com a ajuda de um amuleto mítico que também sabe falar. É uma mecânica simples, mas genial, que transforma a iluminação em parte vital da progressão e do desafio, criando uma ambientação imersiva e até poética.
O level design é um dos pontos altos do jogo. Cada nova área ensina, com cuidado, as habilidades necessárias para o próximo desafio. O jogo respeita seu tempo. Quando chega a hora das perseguições, dos bosses (como a Bola de Pelo Gigante ou o temido Pazuzu) e dos desafios mais cabeludos, você já está preparado, não porque o jogo pegou na sua mão, mas porque soube ensinar com inteligência.
Há também espaço para ação, com pulos duplos, dashes, voos e puzzles bem bolados. A variedade mantém o ritmo sempre fresco, e os momentos mais tensos são equilibrados com o bom humor sutil e a fofura irresistível do personagem principal.
Visualmente, Devil’s Drizzle é um deleite. O pixel art é detalhado, expressivo e cheio de identidade. É como mergulhar num livro de ilustrações melancólicas com uma pitada de magia sombria, uma estética fofa, mas com um tempero sutil de assombração, que lembra Celeste ou Yoshi’s Island em seus momentos mais introspectivos. E o tempero brasileiro está presente não só no estilo visual, mas também no humor e na alma do projeto.
Com múltiplos finais, fases cheias de segredos e uma história delicada que fala sobre perda, imaginação e medo da solidão, Devil’s Drizzle é mais que um jogo indie, é uma experiência tocante. Mesmo com algumas pequenas limitações técnicas aqui e ali (como performance ou animações ainda em desenvolvimento), o que está aqui já é especial. E o melhor, com direito a sustos, reflexões e coração quentinho no final.
[Nota do Editor: Devil’s Drizzle foi analisado a partir da sua versão para PC via Steam. A cópia do jogo foi gentilmente cedida por Filipe Acosta para avaliação.]